Apesar da polêmica, Funai prepara demarcação de terra indígena catarinense
A Fundação Nacional do Índio (Funai) prepara licitação para contratar a empresa de topografia que vai realizar a demarcação da terra indígena Itaty do Morro dos Cavalos, em Palhoça, Santa Catarina. A portaria ministerial declaratória, publicada em 18 de abril deu posse da terra aos guaranis Mbyás e Nhandevas. Nesse primeiro momento serão identificadas as propriedades que devem ser indenizadas para posterior homologação pelo presidente Lula, segundo o coordenador geral de proteção e demarcação de Terras Indígenas da Funai, em Brasília, João Antônio de Sá.
O cacique da aldeia guarani Itaty, Augustinho Werá Tukumbó, lembra que seu povo espera há muito tempo pela demarcação da sua terra e revela a angústia da comunidade, onde vivem 142 pessoas: “Queremos plantar tranquilos e viver em paz. Vivemos nessa terra há mais de 50 anos, meu avô de 99 anos ainda vive na aldeia”, explicou. Ele lamenta a falta de consideração dos “vizinhos colonos” que reivindicam pela revogação da medida da portaria declaratória.
A antropóloga, coordenadora do Programa Guarani do Centro de Trabalho Indigenista e do Grupo de Trabalho dos estudos de identificação e delimitação da terra indígena Morro dos Cavalos da Funai, Maria Inês Ladeira, explica que na questão da demarcação das terras, a origem dos guaranis tem sido muito questionada em Santa Catarina. Segundo ela, a aldeia do Morro dos Cavalos integra uma rede de aldeias situadas nas regiões Sul e Sudeste com extensões no Paraguai e na Argentina.
Herança e direito à terra
Essa região constitui o território tradicional Guarani. “A história Guarani nessas regiões do continente sul-americano é intensa e foi registrada, embora não totalmente, pelos viajantes em distintos períodos do processo de colonização”, conta Maria Inês.
A antropóloga argumenta que a herança cultural deixada pelos guaranis pode ser observada na toponímia e em vários elementos da nossa própria cultura. Assim, segundo ela, a terra demarcada corresponde a um espaço de uso presente e futuro não só para a comunidade Guarani atual, mas também para as novas gerações. “Há que se entender que as pequenas áreas que os guaranis ocupam são para o sustento de uma sociedade que, ao longo de séculos de opressão, vem se mantendo íntegra, propondo a si as mesmas estratégias criativas para se situarem no mundo atual.”, explica Maria Inês.
Para a antropóloga, é necessário que a sociedade civil e os governos nos quais se situam as terras guaranis tenham consciência da gravidade da situação que este povo se encontra, por falta de terras e matas. “Que parem de transformá-los em invasores e estrangeiros, que se colocam contra uma população original de brasileiros”.
O que também surpreende Maria Inês são as acusações ao processo de identificação e delimitação, que segundo ela, são apregoadas por pessoas que nem sequer leram o relatório, onde sem dúvida encontrariam explicações sobre os critérios utilizados.
Quanto à alegação feita pelo deputado federal Valdir Colatto (PMDB/SC), de que a criação da reserva irá alterar o projeto da duplicação da BR-101, e que traria mais despesas, cerca de R$ 50 milhões, com a construção de um viaduto, Maria Inês esclarece que o Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transporte (DNIT) já apresentou uma alternativa independente da demarcação da terra indígena, que seria a construção de dois túneis, e não de um viaduto.
(Por Flora Neves, AmbienteJÁ, 08/08/2008)
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